terça-feira, 12 de julho de 2011

sobre paixões

            Você já se apaixonou? Quando se está apaixonado por alguém, seus olhos brilham apenas ao ouvir o nome da pessoa amada. Uma vibração estranha invade seu corpo quando ouve sua voz, quando vê seu nome na tela do celular enquanto toca a música que você reservou com tanto carinho para aquele contato. Nada é banal quando se está apaixonado. Cada conversa pode durar intermináveis horas, ainda que o assunto em questão seja o mais tolo de todos.
            Engana-se, porém, aquele que pensa que a paixão está unicamente relacionada à dois corpos. Paixão não está relacionada apenas ao desejo físico. A paixão deve estar entrelaçada na vida como um todo. Apaixonado – e por consequência, feliz - é aquele que consegue fazer com que atividades simples e banais do dia-a-dia se tornem magníficas e esplendorosas.

            Lembro de minha infância, quando minha mãe torcia para que eu fosse médica quando crescesse. Seu maior sonho era me ver vestida de branco, cuidando da saúde de crianças, da mesma forma com que via, admirada, as médicas cuidarem de mim. Coitada. Será que ela não percebia o quanto eu detestava aquele ambiente? Não percebia que minha única consolação nos dias de consulta era conversar com os outros pacientes na sala de espera? Não posso acreditar que minha própria mãe não notava meus olhos brilhando enquanto alguém me contava uma história - qualquer que fosse -para distrair a pobre menininha louca para voltar para casa.
            E até hoje meus olhos brilham. E sei que minha mãe também sente algo intenso dentro de si quando termina de bordar as inúmeras pérolas em um vestido de noiva e vê os olhos de uma jovem moça brilharem ao olhar seu reflexo no espelho. Eu sei por que nós três dividimos o mesmo sentimento, ainda que empregados de formas diferentes.
            Da mesma forma com que minha mãe, ainda que com o punho esquerdo sempre dolorido devido os mais de 15 anos dedicados à profissão, enfeita delicada e cuidadosamente o traje mais importante que uma mulher pode vestir, me ensinaram a ouvir cada história como se fosse a última a que eu pudesse me deleitar.
            Ela sempre choraminga de dor. Dói a tendinite que a impede de muitas fezes segurar uma garrafa de refrigerante. Mas suas palavras nunca mudam quando pergunto por que não larga a vida dos bordados: “eu amo muito o que faço”, diz olhando nos meus olhos.

            Cada noiva é única para minha mãe, ainda que o vestido alugado seja o mesmo. Assim somos nós, aspirantes a jornalistas. Nenhuma história é igual à outra. Nenhuma marca, nenhuma cicatriz, nenhuma lágrima, nenhum sorriso. Ninguém é igual a ninguém. A forma de lidarmos com essas diferenças não vem descrita em nenhum manual. Dia após dia, minha mãe descobre um novo bordado e eu, uma nova forma de reportar a vida de alguém.

            Pela vida de minha mãe, passaram patroas e amigas que a ajudaram a desenvolver sua arte. Pela minha, ouve, em especial, um mestre. Não me esqueço de suas palavras: “você nasceu para escrever”. Se foi pra isso que eu nasci, ainda não sei. Mas sei que quando o faço, sinto borbulhar algo forte, que me pressiona até que eu acabe de escrever. Aquela frase despertou em mim uma paixão adormecida. E desde então, aquela mesma voz vem me ajudando a nutrir e desenvolver esse sentimento. A mesma paixão que me arrebata quando alguém escreve em mim sua história através de palavras ditas e gravadas em meu pequeno gravador e em minha memória.
            E essa experiência não é exclusividade minha e de minha mãe. Não é algo que ela me transmitiu pelos genes. Existe uma paixão em cada um de nós que nos faz capazes de tornar algo diferente de tudo o que possa parecer se assemelhar. E o fazemos de tantas a tantas formas. Escrevendo textos secretos, compondo raps impactantes, adornando vestidos brancos, vestindo camisas vermelhas e pretas. São paixões que borbulham. São sentidos, sentimentos e sensações que nos arrebatam e nos transformam em indivíduos, não em números. E nós, por vez, individualizamos o que possa simbolizar nossas paixões.
            Essas palavras podem até parecer copiadas de algum livro de auto-ajuda perdido numa estante empoeirada de um sebo. Que pareçam, então. Mas você há de concordar que, sem paixão, não se chupa  nem um picolé.

3 comentários:

  1. tive o prazer de estar presente na primeira leitura desse texto. Ouvi as palavras do "chefe" que disse: "Há textos que são feitos para todos , mas para apenas um entender. E eu entendi"

    Eu tambem entendi!

    Apaixonante

    bjo³ do anônimo

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  2. Maravilhoso. Cada Vez me encanto mais!! parabéns lindonaa!!!

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Déh