sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Como nos velhos domingos

Da minha infância tenho inúmeras memórias boas, dentre elas, os domingos. Ter meus pais em casa era meu maior deleite da semana. Passava os dias assistindo TV em casa ou brincando com as outras dezenas de crianças na rua, o que me fazia suficientemente feliz, mas não via a hora de acordar e perceber que era domingo, dia de meus pais não trabalharem.

Íamos juntos à padaria, onde meu pai pedia pão, mortadela e um habitual Kinder Ovo para mim. Semanalmente, eu ganhava mais um brinquedinho inútil e de cunho completamente colecionável para enfeitar meu quarto ou se perder em meio a tantas outras quinquilharias de criança.
Haviam também as feiras. Ainda consigo ouvir o barulho da rodinha cambaleante do carrinho de ferro dobrável que minha mãe puxava ao lado de minha vó. Passeávamos pra cima e pra baixo pelas ruas de Morro Agudo com compras de legumes e frutas individualmente provadas nas bancas. Gostava das uvas. Provava uma a uma, sem deixar faltar nenhum tipo diferente. As laranjas, sempre bem amarelinhas cortadas em quatro partes, se exibiam para mim, convidando-me a conhecer mais uma vez seu sabor antes que minha mãe pedisse uma dúzia delas ao vendedor. Quanto à melancia, era figurinha carimbada em nossos carrinhos, nem que fosse apenas a metade. Os pastéis de carne acompanhados de gelados caldos de cana eram meu café da manhã nesses dias.

As ruas, sempre completamente lotadas, eram palco para brigas entre pedestres, ciclistas e motoristas, que lutavam ferozmente por espaço. Junto à eles, estavam os vendedores de caranguejo, peixes e brinquedos baratos que meu pai comprava sorrindo após minhas enormes insistências. No entanto, nenhum pequeno agrado paterno se comparava ao excepcional sorvete feito por uma máquina velha que ficava num cantinho da principal rua do bairro, comandada por um senhor ruivo e calvo.

Era uma grande geringonça de metal, com garrafas de vidro emborcadas para baixo com refrescos artificiais, fixas em ambas laterais da máquina. Era só escolher o sabor e em segundos o sorvete era cuspido cremoso e graciosamente, em meio à barulhos e espasmos da velha sorveteira. A colherinha de madeira, típica de sorvete, era o toque final daquela pequena obra de arte que não levava nenhuma gota de leite em sua composição, mas sua beleza era semelhante a algodão-doce derretido. 

Hoje eu encontrei uma dessas máquinas. Obviamente pedi um sorvete de morango, meu sabor preferido desde os velhos tempos. Enquanto observei-o sendo feito, as memórias que explodiram dentro de mim, tranportaram-me por um momento para as manhãs ensolaradas de meus domingos infantis e maravilhosos.  Olhar para o operador daquela máquina amarela e vê-lo segurar o copo de plástico a espera do meu sorvete que caía lentamente, me fez sentir como se tivesse 6 anos outra vez. Mas não tenho.

Quando ele me entregou o sorvete e eu o provei, percebi que seu sabor nem era tão bom assim. Talvez com o passar dos anos meu paladar perdeu a sensibilidade para doces típicamente infantis. Mas sinceramente não importa se era o sorvete sabor "ki-suco de morango" que ele me vendera era bom ou não. Quando a colher - de plástico, infelizmente - transportou-o para dentro de minha boca, só senti o sabor das lembranças.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

E lá vamos nós!


Lembram dessa bruxinha do Pica-Pau? Nossa, que nostálgico!

A minha infância inteira foi permeada por maravilhosos desenhos animados que coloriam as tardes em que eu era proibida pela minha vó de sair de casa. Ir brincar na rua de barro seco era minha atividade preferida, mas eu a substituía com gosto pelas animações que o SBT exibia.

Existem episódios incríveis que nunca saíram da minha cabeça. Eles simplesmente serviram como exemplos em muitos aspectos da minha vida e eu chego a acreditar que quem diz que na TV não passa de nada de construtivo não sabe o que ta dizendo! rs. 

Com os desenhos animados que eu assisti, depois de chegar da escola e comer bolinho de chuva bebendo Nescau, aprendi lições que carrego sutilmente comigo pro resto da vida. Uma delas é essa daí, da bruxinha. "E lá vamos nós!".

Sinceramente eu não me lembro do episódio inteiro, não. Só sei que no final das contas existe essa chatinha aí que não desistiu até achar sua vassourinha mágica. Ela paga sua moedinha ao Pica-Pau (eu acho que é assim, rs), pega uma vassourinha num grande estoque, "monta" sobre ela, arrasta seu pezinho e diz em alto e bom som a célebre frase que você já deve ter repetido pelo menos uma vez na vida.

Lembro de achar o episódio até meio chato, devido a enorme insistência da personagem e da grande repetição do "e lá vamos nós". Ela simplesmente não se cansa. Vassoura após vassoura, a velha bruxinha segue tentando, com a certeza que uma hora irá achar aquela que tanto procura.

Sua vassoura não era simplesmente uma composta pelos típicos cabo e palha. Sua vassoura a fazia voar, exatamente como devem ser as vassouras das bruxas. E no meio de tantas outras vassouras que se misturavam entre si, nada a fazia desistir de encontrar aquela que era feita para ela, que atendia quando ela gritava "e lá vamos nós".

No final das contas, eu não consigo lembrar se ela encontra sua vassourinha no episódio ou o que quer que seja. Na verdade isso pouco importa. E daí se ela passou a eternidade repetindo sua fala, arrastando o pé enquanto se agarrava a uma nova vassoura, acreditando que dessa vez voaria? Isso tanto faz. Ela merece respeito porque não desistiu e é isso que me marcou tanto. Não há como não se inspirar com tamanho exemplo de persistência. 

A gente precisa aprender com tipos como o dela, que não param quando percebem que "não foi dessa vez". Precisamos aprender a acreditar que existe por aí, no meio de um tumultuoso estoque de vassouras, aquela que é feita para cada um de nós. E não há problema em experimentar cada uma delas, desde que tenhamos sempre a mesma disposição ao soltar o comando e esperar pra ver se dessa vez vamos alçar voo. 

E se não voarmos - tudo bem! Vamos torcer para que hajam novas vassouras e muita disposição para tentarmos outra vez. Mas tenhamos pressa, pois pelo o que ouvi dos passáros e das bruxas, voar é bem divertido. Então? "E lá vamos nós"?



domingo, 4 de setembro de 2011

Parece fácil, mas é difícil

É tão fácil julgar os outros, né? Olhar pro lado e apontar o dedo na direção de outra pessoa é uma tarefa mole de se cumprir, ainda mais se você não souber nada sobre ela. Difícil é procurar entender, compreender todo o contexto, analisar o conteúdo, indo bem além do superficial. Mais difícil ainda: se colocar no lugar do julgado

Engraçado falar assim. "Julgado". Vamos abandonar o politicamente correto, chutar nossas hipocrisias e admitir que sim, mesmo não querendo, julgamos as pessoas. O tempo todo, diga-se de passagem. Não adianta dizer que "nããão, eu não julgo ninguém" que é mentira - julga sim! Eu julgo. Sou humana cheia de erros e falhas. Por favor, não me faça sentir que sou a única má desse conto de fadas tortuoso.

Mas como disse, contar a história a partir de um ângulo é moleza. Basta arrumar um cúmplice disposto a se render à alguns minutos (ou horas) de papo-furado (ou fofoca...), um assunto (no caso, um alguém) e algumas pedras nas mãos para que o serviço seja completo (olha eu aqui, julgando quem julga também. rs).


Na universidade eu aprendi com uma professora que não dá pra escrever uma reportagem com um único entrevistado. É preciso ter fontes confiáveis, personagens interessantes e que apresentem pontos de vistas minimamente diferentes ou que reforcem a fala do personagem anterior. Vamos trazer isso pro nosso dia-a-dia, independente de nossas graduações, que tal?

Acho que tô dando voltas pra falar algo que na verdade eu ainda não sei expressar. Vamos lá: me sinto julgada. E eu odeio ser julgada sem uma defesa. Pff! Vamos assumir: quando damos a oportunidade da pessoa na berlinda se defender, né?

De uma coisa eu sei: a juíza do meu caso sou eu mesma. Não importa o que pensam, o que falam ou o quão bruxa má do leste o mundo acredita que eu seja. Eu tô é dando mole deixando-me abater com opiniões alheias. Mas também existe um lado positivo: ao passar por essa "triagem" eu percebo que as pessoas com que eu mais me importo conseguiram fazer uma boa leitura da minha história e me compreendem. E além disso: me respeita e apoiam.

É triste perceber que existem olhos que me fuzilam, pedras que me acertam e palavras que, mesmo eu não ouvindo, me cortam. Mas quem me julga tem seu direito. Quem me condena, pode não me conhecer.

Precisamos abrir nossas mentes para um sem-número de aspectos da "sociedade moderna", mas quando o assunto é a vida de outra pessoa, rapidamente nos debruçamos sobre a janela, cruzamos os braços e começamos a destilar palavrinhas afiadas como bem faziam as guardiãs das fofocas de novela de época. 

Ok. Vão em frente: estou de braços abertos esperando cada uma das unhadas que estão por vir. Fiquem a vontade. Saibam que eu posso - e certamente, vou - chorar, mas eu conheço a minha história. Só Deus sabe quem eu realmente sou - e tenho fé que um dia ele me conte - e o que há dentro de mim. Estão todos livres para olhar meus lençóis no jardim através de janelas cujos vidros estão sujos. Eu sei como eu os lavei. Sei por que os escolhi e por que me envolvo com eles.